
Planeatário de Akashi ♥ fonte: Hyogo Japan
Eu visitei o Centro de Ciências Astronômicas em Akashi. Eu pego o Expresso de Osaka e troco de trem em Sanyou. O trem faz barulhos de estalido e balança pra trás e pra frente parando em cada estação, acompanhando o cenário do oceano. Eu desci em uma estação minúscula chamada Harumazen, e podia ver o formato da torre de astronomia, que lembrava uma grande torre de relógio.
A 135 graus de longitude leste, o meridiano lá controla os fusos horários do Japão e também tem um museu de estrelas. Eu vi um relógio de cristal de quartzo que parecia saído de um futuro no estilo Osamu Tezuka, e uma exposição onde você pode experimentar pessoalmente a Lei do Movimento Planetário de Kepler usando um chip, e fiz um tour pelos modelos enquanto esperava pelo show do planetário. Achei que a cúpula do planetário deveria ser maior que o resto das exposições. As estrelas foram projetadas no teto, e era o céu real, mas ainda mais real que o real, pois era mais profundo e vasto. Estava a um milhão de anos-luz de distância, e fui atacado por esse sentimento de desolação. O horizonte de Akashi foi quabrado em fileiras de silhuetas, e a infinidade do céu noturno fez meu peito começar a doer. Olhei para baixo e notei o formato do projetor, que lembrava uma formiga gigante. Foi nesse momento que comecei a pensar: "Huh. Neste planetário, as estrelas que estou olhando agora não são reais." Normalmente, eu realmente não olho para o céu noturno. Mas o céu estrelado projetado no planetário tocou meu coração mais do que o céu noturno real jamais atraiu.
Eu prefiro um pedaço redondo de vidro a um diamante, e um robô a um humano de verdade. Eu gosto das fotografias de manequins de Bernard Faucon, dos efeitos sonoros de Oobayashi Nobuhiko, e opera Takarazuka. A essência de uma jovem dama é um tipo de "imitação", e com essa única palavra eu posso expressar isso abertamente. Quando uma réplica "feminina" e uma réplica de "menino" existem simultaneamente, ela é chamada de "menina". Uma jovem dama é uma imitação da realidade do mundo. Se você extrair toda a fofura e beleza artificiais, ficará com um desbalanceado, ainda que puro, androide. A voz do guia nos informou que o amanhecer se aproximava do planetário. O céu estrelado voltou a ser uma tela branca; Alice abriu os olhos e foi forçada a se separar dos coelhos que usavam colete. Os relógios que regulam o horário do Japão no Centro de Ciências Astronômicas tinham ponteiros de segundos que começaram a cortar pedaços da realidade.
♡ Créditos:
Japonês para inglês: Curi
Inglês para português: Ichigo Hime
♡ Notas da tradutora: Eu achei muuuuito interessante esse texto porque fala (não sei se o Novala tinha essa intenção) sobre a performance da feminilidade como algo artificial.
Interessante também notar que, embora hoje em dia androide seja sinônimo de robô com feições humanas, a palavra em si vem de "andro" (do grego, "homem". Diferente de "humano" ou "pessoa", que seria "anthropos") + "oide" ("semelhante a", mas muitas vezes de forma incompleta). No trecho "Se você extrair toda a fofura e beleza artificiais, ficará com um (...) androide" fica claro que o referencial "natural" é masculino, e tudo o que diferencia o homem da mulher é artificial. E ainda é falado que a menina é uma "mistura" da mulher e de um menino (se as meninas não buscassem emular a feminilidade da mulher adulta, passariam por meninos).
Eu não vou entrar na discussão do que é ser ou não mulher, mas eu vou sim concordar que muito do que é considerado feminino é artificial, vide inúmeros artifícios utilizados para que nos encaixemos no padrão do que é ser mulher na nossa sociedade, mesmo ainda sendo esperado que a gente mantenha uma ilusão. Tem que usar maquiagem e fazer as unhas, por exemplo, mas nada de maquiagem carregada ou de unhas muito longas ou chamativas. Vamos fingir também que mulheres adultas não têm pelos, porque depilação é muitas vezes visto como o mínimo, e não como uma opção (e tem quem ainda diga que é escolha, mas será que é mesmo escolha se uma é bem aceita e a outra faz você se sentir suja e ser julgada como desleixada?).
Também há quem defenda fazer todos os esforços por "gosto", como se a gente vivesse em um vácuo onde nossas preferências não fossem influenciadas pela comunidade em que estamos inseridas e reforçada pela mídia.
Enfim,um curto texto de três parágrafos me deu bastante o que pensar... Inclusive que tenho O mito da beleza (Naomi Wolf) na minha estante e já pensei várias vezes nos últimos dias que deveria atropelar as leituras que tenho pela metade e começar ele logo!
Esses sapatos foram meus favoritos e também os que mais usei por lolita por muito tempo. Os primeiros que tive comprei em uma comunidade do orkut por R$100, e eram da Ling Lam, uma marca de sapatos chinesa que vendia no eBay. Foram vários anos felizes até que, como acontece com os produtos de P.U ("couro" sintético), ele começou a descascar inteiro, e não teve como salvar.
Nesse meio tempo também comprei um rosa bebê da Body Line, sem as tiras de amarrar, e achei que teria outro vermelho novo em pouco tempo, mas não foi assim. Ia comprar outro da Body Line porque gostei da qualidade, mas eles não repuseram mais os sapatos e fiquei a ver navios.
A Melissa, que tem diversas collab com a Vivienne Westwood, lançou os Rocking Horse Ballerina em 2014, mas também consegui comprar na época.
Mas por que estou falando sobre tudo isso? Porque ontem, depois de muita espera, frete caro e ser taxada pela alfândega, chegou meu novo par de RHS vermelhos. Final feliz? Na verdade não porque não me serviu, o vendedor insiste que mandou o tamanho certo sendo que eu comprei um número maior do que costumo pedir e mesmo assim não entrou no meu pé. E eu, como pessoa cronicamente online que sou, fui desabafar no twitter (nunca será X). O que eu não esperava é que ia ter um monte de básica se perguntando "meu deus, que sapato é esse?" e falando que "de graça ainda seria caro". Vamos ignorar que um original está na faixa de 400£, por enquanto.
Fiz uma mini thread muito resumida explicando, mas não fiquei satisfeita e vim aqui tirar as teias de aranha para falar mais detalhadamente para vocês sobre QUE SAPATO É ESSE.
♡︎ A origem ♡︎
O primeiro rocking horse surgiu na coleção "Mini Crini", de Primavera/Verão de 1985. Uma coleção marcada por corpetes, corsets e crinolinas curtas (daí o nome).
Olhando as fotos da coleção agora pode não parecer nada tão novo, afinal para nós que gostamos de moda lolita (e talvez outros estilos inspirados por períodos históricos) é fácil de assimilar a silhueta e de onde vêm as inspirações, mas lembrem-se: esses eram os anos 80. A silhueta, as cores, toda a estética da época era muito diferente do que a Vivienne Westwood propunha: cintura marcada e saias amplas ao invés de ombros realçados por ombreiras, tons sóbrios no lugar de neons, inspiração no passado ao invés da preocupação em parecer "futurista" ou moderno.
♡︎ Melissa x Vivienne Westwood ♡︎
O Rocking Horse Ballerina da Melissa foi lançado em 2016, custava R$350 na época e até hoje é possível encontrar ele a venda por preços exorbitantes na Amazon e eBay na gringa e por aqui no Enjoei. Em uma rápida busca achei um par sendo vendido por humildes R$2660.
Eu já comprei muita Melissa da Vivienne no Enjoei, inclusive uma Three Straps Elevated por R$30, mas parece que desde a morte da diva os preços subiram exponencialmente.
A Melissa também tem outro Rocking Horse que é o Wing Shoe, mas a plataforma é bem mais discreta e sinto que ele muitas vezes passa despercebido. A parceria da Melissa com a Vivienne Westwood rendeu vários modelos belíssimos, e ficarei feliz em falar mais sobre no futuro, caso se interessem.
♡︎ NANA ♡︎
Quem conhece sabe (sorry) que a Yazawa Ai é extremamente fashionista, inclusive NANA e Paradise Kiss foram publicados na revista Zipper, que é uma revista de Moda, e não um periódico de quadrinhos (como é o caso da Ribon - onde foi publicado Gokinjo Monogatari, também da Yazawa, que conta a história da irmã mais velha da Miwako de ParaKiss, Mikako - Cookie e da Shonen Jump, por exemplo).
Quando se trata de Vivienne Westwood,o primeiro mangá (que também tem anime e live action) que vem à mente é NANA. Eu não vou entrar aqui em detalhes aqui sobre NANA porque o post é sobre RHS e Vivienne Westwood, mas vou só falar pra vocês que é meu mangá favorito de todos os tempos e que ele mudou profundamente quem eu sou. Só não digo que é uma leitura obrigatória porque é um caminho sem volta e pode deixar feridas abertas como deixou em mim, sobretudo por não ter um final até hoje. Eterno hiatus. Enfim. Divagando.
São muitas as referências à Vivienne Westwood no estilo dos personagens de NANA, inclusive o Ren foi inspirado pelo Sid Vicious dos Sex Pistols (de quem a Vivienne já foi stylist quando era casada com o Malcolm McLaren, empresário deles e também sócio na boutique SEX).
Diversos personagens aparecem usando os RHS, homens e mulheres, e também há variação de modelos. Também há outras peças da Vivienne que aparecem na série. Menção honrosa para a jaqueta de coração (que é um presente da Misato pra Nana Oosaki).
Outros acessórios icônicos na série incluem o isqueiro do Shin, o armor ring da Nana Oosaki e os acessórios de pérola usados por ambas as Nanas. Todos eles existem na vida real e já foram lançados pela marca.
♡︎ Kamikaze Girls ♡︎
Kamikaze Girls (Shimotsuma Monogatari, no original) é um filme muito popular entre as lolitas, baseado no livro (que depois virou quadrinho) do Novala Takemoto.
Eu creio que os sapatos que a Momoko mais aparece usando não sejam de fato RHS da Vivienne, e sim uma versão que a BABY, THE STARS SHINE BRIGHT lançou. Some-se a isso o fato de que no próprio filme a BABY é simplesmente tudo pra Momoko, e o Novala já trabalhou em collabs com a marca, então faz muito sentido ser um desses modelos. No entanto, quis mencionar mesmo assim porque mostra a influência da Vivienne também na moda lolita.
Acho difícil que algum entusiasta de moda lolita ainda não conheça o filme, mas se você ainda não viu: recomendo. É bem divertido. Fala sobre a amizade inusitada entre uma lolita e uma yankii (gangue de motociclistas) no interior rural do Japão.
Fun Fact: A Anna Tsuchiya, que interpreta a Ichigo no filme, é a voz que canta as músicas da Nana Oosaki no anime.
Há anos que é quase impossível você folhear uma revista de street snaps e não se deparar com alguém usando os icônicos sapatos, mas isso não significa que os RHS sejam uma unanimidade mesmo entre os adeptos da moda alternativa. Na verdade, lá por 2010-2012, no auge do OTT sweet lolita e declínio do oldschool, tinha muita gente que verdadeiramente detestava e fazia questão de expressar isso. Há pouco tempo atrás o oldschool teve um revival, e hoje em dia as pessoas são mais neutras com relação não só aos RHS, mas com a variedade de combinações possíveis dentro da moda que antes seriam vistas como inaceitáveis.
Para finalizar, eu gostaria de ressaltar que gosto é subjetivo, e que tudo bem você achar feio. Não é porque estilista X ou Y fez que você tem a obrigação de gostar, mas por que é tão normal as pessoas verbalizarem opiniões de repulsa sem o menor conhecimento do contexto? A gente não precisa opinar sobre tudo, muito menos sobre o que não entende.
Porém, a questão que eu realmente gostaria de levantar aqui é: será que a Moda serve só pra ser bonita? Será que os estilistas deveriam só seguir uma macrotendência mais palatável ou o papel da Moda, como arte, também é nos fazer questionar um pouco o que é convencional, usual e ir um pouco contra o que é visto como "normal"? Se não fosse assim, bastaria só repetir em looping tudo o que já foi feito, sem releituras e sem criar nada de novo, apenas reproduzir o que já é aceito.
E foi esse o meu não tão breve post sobre QUE SAPATO É ESSE e como, mesmo tendo sido lançado há quase 40 anos (eu tenho que parar de achar que a década de 80 foi 20 anos atrás), ele ainda é presente e influente na moda japonesa e internacional.
Normalmente eu digo algo como "Ru Oshiba é legal" ou "Morimoto Leo é sexy", o que leva as pessoas a me enviarem cartas como "Pessoalmente, não tenho nada contra homossexuais. Novala-san, boa sorte para você e tente o seu melhor apesar de como o mundo vê você." Não tenho nenhum problema particular em pensar sobre homossexuais. Mas a verdade é que, como não sou um, sempre me meto em problemas quando sinto que devo justificar isso de alguma forma.
Jovens damas adoram homossexuais. Das pinturas de Takabatake Kashou de amor gay proibido entre belos jovens rapazes, ao trabalho definidor de gerações de Takemiya Keiko "A Canção do Vento e das Árvores", os homossexuais são um tema eterno para as jovens damas. Por que as jovens damas gostam da homossexualidade (geralmente entre os jovens garotos)? Porque é a origem do desejo sexual distorcido de uma jovem. A luxúria da jovem é como a luxúria de dez mil pessoas. No entanto, uma jovem elegante não permitirá que seu desejo direto surja de cara (como em uma edição da Popteen).
O gênero contém tanto curiosidade quanto repugnância, anseio e ansiedade, realidade e aceitação, o desejo sexual de uma jovem dama é como abrir caminho através de um labirinto. Dentro desse complexo labirinto cozinha o desejo da jovem dama de que sua carne participe pessoalmente desse amor gay. Sua estética perfeita seria a "fantasia homossexual". A jovem garota se fecha em um mundo fictício para manter o equilíbrio de sua libido. Não tenho certeza, mas talvez o narcisismo e a negatividade incluídos na vita sexualis sejam muito preocupantes para a comunidade gay real. Mas essas coisas não são importantes para a jovem dama fundamentalmente egocêntrica.
Na verdade, temos medo do amor verdadeiro. Se pudermos segurar um amor que é como um beijo debaixo da árvore de lilás, talvez isso seja maravilhoso. Mas não somos muito bons nisso. O verdadeiro amor é derivado de um instinto animalesco que acaba sendo uma faca de dois gumes, e precisamos ser levados a perceber isso. No entanto, não podemos esquecer completamente o conceito de amor verdadeiro. Possuímos um Eros com defeito de nascença, que faz com que nossos instintos tranqüilos se amotinem. A cidade transborda de pura libido e, assim como o amor em uma música de Chage & Aska, não há lascas de imaginação nesse amor de cachorro.
Honestamente, o amor direto não é insignificante. Uma jovem dama deve acostumar-se aos emaranhados da contenção como sua condição essencial, se estiver em busca de um amor angustiado ao estilo barroco. Como o sonho do menino com o corpo translúcido e os cabelos castanhos, como duas ervilhas em uma vagem com dedos finos entrelaçados, respirando respirações recíprocas. Olhos brilhantes, rodeados de flores. Há muito tempo, a carne se desviou de si mesma para criar uma espécie de ultracarne. Os hobbies da menina evasiva e sua abusiva falta de contemplação; esse é o existencialismo de uma jovem.
♥ Créditos:
Japonês para inglês: Curi
Inglês para português: Ichigo Hime