terça-feira, 9 de abril de 2024

o planetário e garotas de imitação


Planeatário de Akashi ♥ fonte: Hyogo Japan

Eu visitei o Centro de Ciências Astronômicas em Akashi. Eu pego o Expresso de Osaka e troco de trem em Sanyou. O trem faz barulhos de estalido e balança pra trás e pra frente parando em cada estação, acompanhando o cenário do oceano. Eu desci em uma estação minúscula chamada Harumazen, e podia ver o formato da torre de astronomia, que lembrava uma grande torre de relógio.

A 135 graus de longitude leste, o meridiano lá controla os fusos horários do Japão e também tem um museu de estrelas. Eu vi um relógio de cristal de quartzo que parecia saído de um futuro no estilo Osamu Tezuka, e uma exposição onde você pode experimentar pessoalmente a Lei do Movimento Planetário de Kepler usando um chip, e fiz um tour pelos modelos enquanto esperava pelo show do planetário. Achei que a cúpula do planetário deveria ser maior que o resto das exposições. As estrelas foram projetadas no teto, e era o céu real, mas ainda mais real que o real, pois era mais profundo e vasto. Estava a um milhão de anos-luz de distância, e fui atacado por esse sentimento de desolação. O horizonte de Akashi foi quabrado em fileiras de silhuetas, e a infinidade do céu noturno fez meu peito começar a doer. Olhei para baixo e notei o formato do projetor, que lembrava uma formiga gigante. Foi nesse momento que comecei a pensar: "Huh. Neste planetário, as estrelas que estou olhando agora não são reais." Normalmente, eu realmente não olho para o céu noturno. Mas o céu estrelado projetado no planetário tocou meu coração mais do que o céu noturno real jamais atraiu.

Eu prefiro um pedaço redondo de vidro a um diamante, e um robô a um humano de verdade. Eu gosto das fotografias de manequins de Bernard Faucon, dos efeitos sonoros de Oobayashi Nobuhiko, e opera Takarazuka. A essência de uma jovem dama é um tipo de "imitação", e com essa única palavra eu posso expressar isso abertamente. Quando uma réplica "feminina" e uma réplica de "menino" existem simultaneamente, ela é chamada de "menina". Uma jovem dama é uma imitação da realidade do mundo. Se você extrair toda a fofura e beleza artificiais, ficará com um desbalanceado, ainda que puro, androide. A voz do guia nos informou que o amanhecer se aproximava do planetário. O céu estrelado voltou a ser uma tela branca; Alice abriu os olhos e foi forçada a se separar dos coelhos que usavam colete. Os relógios que regulam o horário do Japão no Centro de Ciências Astronômicas tinham ponteiros de segundos que começaram a cortar pedaços da realidade.

Créditos:
Japonês para inglês:
Curi
Inglês para português: Ichigo Hime


Notas da tradutora: Eu achei muuuuito interessante esse texto porque fala (não sei se o Novala tinha essa intenção) sobre a performance da feminilidade como algo artificial.

Interessante também notar que, embora hoje em dia androide seja sinônimo de robô com feições humanas, a palavra em si vem de "andro" (do grego, "homem". Diferente de "humano" ou "pessoa", que seria "anthropos") + "oide" ("semelhante a", mas muitas vezes de forma incompleta). No trecho "Se você extrair toda a fofura e beleza artificiais, ficará com um (...) androide" fica claro que o referencial "natural" é masculino, e tudo o que diferencia o homem da mulher é artificial. E ainda é falado que a menina é uma "mistura" da mulher e de um menino (se as meninas não buscassem emular a feminilidade da mulher adulta, passariam por meninos).

Eu não vou entrar na discussão do que é ser ou não mulher, mas eu vou sim concordar que muito do que é considerado feminino é artificial, vide inúmeros artifícios utilizados para que nos encaixemos no padrão do que é ser mulher na nossa sociedade, mesmo ainda sendo esperado que a gente mantenha uma ilusão. Tem que usar maquiagem e fazer as unhas, por exemplo, mas nada de maquiagem carregada ou de unhas muito longas ou chamativas. Vamos fingir também que mulheres adultas não têm pelos, porque depilação é muitas vezes visto como o mínimo, e não como uma opção (e tem quem ainda diga que é escolha, mas será que é mesmo escolha se uma é bem aceita e a outra faz você se sentir suja e ser julgada como desleixada?).

Também há quem defenda fazer todos os esforços por "gosto", como se a gente vivesse em um vácuo onde nossas preferências não fossem influenciadas pela comunidade em que estamos inseridas e reforçada pela mídia.

Enfim,um curto texto de três parágrafos me deu bastante o que pensar... Inclusive que tenho O mito da beleza (Naomi Wolf) na minha estante e já pensei várias vezes nos últimos dias que deveria atropelar as leituras que tenho pela metade e começar ele logo!

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